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A política por trás do ENEM

  • 3 de nov. de 2021
  • 4 min de leitura

Atualizado: 15 de dez. de 2021

Se você é um jovem brasileiro e não sabe o que é o ENEM, confesso que estou surpresa. É um dos temas mais falados entre adolescentes durante o ano todo, já que é um dos mais importantes vestibulares do país. Mas, se você é um desses que não têm ideia do que estou falando, aí vai a definição: o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) é realizado pelo INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), que também é responsável pela produção de dados, informações, exames, avaliações e estudos na área de educação.


Em 2009, ENEM passou por uma reforma, que possibilitou ingressos para faculdades públicas e bolsas de até 100% em faculdades privadas, e desde então é o maior e mais importante vestibular do Brasil, possibilitando o acesso ao Ensino Superior a milhares de alunos do país em situações vulneráveis financeiramente.


O que mais chama a atenção é o completo caos que o ENEM tem sido nesses últimos anos, e não me refiro somente à atual época de pandemia. Só para adiantar o assunto, a edição do ano de 2021 contou com o menor número de inscritos desde 2008, com cerca de 4 milhões de participantes, o que se relaciona com a não isenção de alunos faltosos na edição de 2020. Para um pouco de contexto: aqueles em situação de carência não precisam arcar com os custos da taxa de participação do ENEM, isso é a isenção.


A edição realizada em 2020 contou com números altíssimos de faltas. Realizada em fevereiro de 2021, a prova ocorreu durante o ápice da pandemia de COVID-19 no Brasil, sendo que a falta de infraestrutura – tanto física, quanto digital – deixou para fora diversos alunos. Muitos, mesmo com faltas justificadas, também foram esquecidos durante a repescagem, e ficaram sem fazer o ENEM.


A falta de isenções mais diretamente afeta alunos de escolas públicas e famílias em situações precárias (números que só aumentaram durante a pandemia), que, em sua grande maioria, dependem desse auxílio para participarem do ENEM. Esse vestibular, para muitos, é a única esperança de conseguir entrada em uma universidade e é um grande problema ficar de fora dele.


Esse caso foi reavaliado e, em setembro de 2021, houve o retorno da isenção a alunos faltosos da prova do ano anterior. Com essa autorização, o número de inscritos aumentou em 9%, mostrando quantas pessoas teriam sido deixadas de fora em outras situações.


Ainda assim, a falta na edição de 2020 foi uma decisão consciente de muitos e pesquisas indicam que uma grande quantidade de alunos cogita fazer o mesmo esse ano, por sensação de despreparo. Esse sentimento vem, em grande parte, devido às aulas sem aproveitamento durante o estudo à distância, ou falta de acesso. Durante a pandemia, houve milhares de alunos sem internet, sem contato com professores ou escolas – em sua maioridade públicas – que nem contaram com a possibilidade de disponibilizar estudo online.


Nessa situação, as edições do ENEM de 2020 e 2021 serão levadas para a história como duas das mais elitistas, deixando de fora quase 3 milhões de estudantes pobres.


Muitos pensavam que problemas como esses seriam superados em 2020, com o avanço da vacinação e uma possível experiência prévia do governo para lidar com a organização do ENEM em situações anormais, mas não foi bem o que aconteceu... o ENEM de 2021 conta com a mesma desorganização do ano anterior: demora para divulgar datas de inscrições e da prova em si, cortes de orçamentos poucos meses antes da edição e brigas entre governantes relacionadas a censura e outros aspectos de questões.


Sim, você leu essa palavra mesmo: censura. Bolsonaro iniciou debates ao se indignar com pergunta que discutia a diferença salarial entre homens e mulheres no futebol e, em maio desse ano, o INEP passou por dificuldades para publicar um artigo que tratava sobre a alta eficácia de um programa de alfabetização, iniciado na gestão da ex-presidente Dilma Rousseff.


Todos esses problemas são consequências diretas do “troca-troca” de presidentes do INEP, que chegou a níveis de ministros da saúde em plena pandemia. Desde 2018, 5 pessoas já foram retiradas do cargo pelo presidente Jair Bolsonaro. A primeira foi a professora e pesquisadora Maria Inês Fini, que permaneceu por 2 semanas. Foi dispensada após autorizar questões no ENEM que abordaram temas como feminismo, homossexualidade e transgeneridade.


Seguindo Maria Inês, o doutor e professor Marcus Vinícios assumiu. Por seu conservadorismo e valores paralelos ao de Bolsonaro, muitos pensavam que permaneceria no cargo, mas foi retirado após dois meses devido desentendimentos com outros membros do Ministério da Educação. O próximo presidente durou 24 dias: delegado Elmer Coelho Vicenzi, que foi indicado mesmo sem ter ligação alguma à educação, se envolveu em diversas polêmicas até sua demissão.


O próximo na longa lista foi o servidor público federal Alexandre Robeiro Lopes. Apesar de não ter relação com a educação – como Elmer Coelho –, foi o que mais durou, desde maio de 2019 até fevereiro de 2021. Foi demitido por envolvimento com a tal questão da diferença salarial entre Neymar e Marta. Atualmente o cargo é ocupado pelo economista Danilo Dupas Ribeiro.


No fundo de tudo isso, os que mais se prejudicam são os alunos. Essa bagunça toda de falta de informações, dificuldades de contato com a INEP e pessoas deixadas de fora na repescagem, só deixa ainda mais vulneráveis aqueles que dependem do ENEM para ter chances de alcançar o Estudo Superior. Isso cria uma diferença gigantesca entre as camadas da pirâmide social brasileira, além de causar incertezas sobre a quantidade de mão de obra capacitada que estará disponível nos próximos anos no país.

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