Por trás das cortinas do Oscar: a desigualdade na mundialmente famosa premiação
- Jovem Político
- 9 de jun. de 2021
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A primeira cerimônia do Oscar ocorreu em 16 de maio de 1929, em um hotel na cidade de Los Angeles, e contou com a presença de 270 pessoas, tendo cada uma pago 5$ com o intuito de assistir a premiação. No ano de 1998 a audiência bateu o recorde e alcançou o número de 55,25 milhões de espectadores. Em contraste, a audiência da mais recente cerimônia, Oscar 2021, caiu para 9,85 milhões de pessoas. Mesmo com essas variações, o evento apresenta a maior visibilidade mundial em premiações cinematográficas, e ao longo dos seus quase 100 anos de história, contou com um total de 3.140 estatuetas douradas distribuídas. Dentre as principais categorias de premiação, apenas 28 das estatuetas foram entregues a mulheres, e 44 a pessoas negras. Os números são cruéis, mas dentro de um certo contexto, infelizmente justificáveis.
É provável que muitos já se perguntaram: como funciona a escolha dos filmes, atores e diretores que levam a estatueta para casa? Para responder essa pergunta, é necessário que se detenha conhecimento sobre a existência da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas, mais conhecida popularmente pelo termo em inglês, “The Academy”. Ela surgiu como uma instituição restrita a cinco setores (Atores, Diretores, Roteiristas, Produtores e Técnicos) que seriam responsáveis por determinar os ganhadores da premiação por meio do voto. Com o tempo, o número e especificidade das categorias mudaram e passaram a formar o evento como conhecemos hoje. A entrada na Academia é restrita, e só é possível com o devido convite, sendo a filiação vitalícia. A problemática a ser reforçada de modo a relacionar a falta de Oscars ganhos pelas minorias no mundo hollywoodiano é dada pela composição da atual Academia. Ela conta com mais de 6 mil membros, dos quais 93% são brancos e 76% são homens. A média de idade é de 63 anos. Tendo em vista esse quadro, é esperado que o conservadorismo e preconceito retire o merecido destaque dos filmes produzidos ou estrelados por minorias.
Quando o primeiro Oscar aconteceu em 1929, o sufrágio universal era uma realidade distante. O termo “assédio sexual” ainda não existia. Assim, não é surpreendente que a escolha do melhor filme do ano não tenha sido a maior preocupação para as mulheres vivendo nessa época. Contudo, a situação se repetiu em 2019. A esta altura do campeonato, a situação era muito grave, visto que em 92 edições, apenas treze filmes indicados foram dirigidos por mulheres, somando o deprimente número de 3% das indicações. Nas outras categorias, a representação feminina é ainda menor. Até hoje, apenas duas mulheres levaram o prêmio de melhor direção, Kathryn Bigelow, sendo a primeira, pela obra “Guerra ao Terror”, em 2010, e Chloé Zhao, por "Nomadland'', em 2021. “Se são homens (brancos) que dirigem a vasta maioria dos nossos filmes, a maioria desses filmes continuará sendo sobre homens (brancos) e realizados a partir de um ponto de vista masculino (e branco)”. A fala da pesquisadora Martha Lauzen ilustra o resultado da ausência de mulheres no universo cinematográfico, tanto no tapete vermelho quanto dentro da Academia, e reflete um comportamento opressor que certamente vai muito além das telas.
No ano de 2016 o movimento #OscarsSoWhite tomou forma dentro das redes sociais, pedindo por uma maior diversidade na premiação. Traduz-se “Oscars tão brancos”, a hashtag que precisou de 80 anos de exclusão para se estabelecer, foi responsável por mobilizar internautas na luta contra o evidente racismo presente na premiação norte-americana. Dentre as estrelas dos filmes gravados durante os anos de 2015 a 2016, apenas atores e atrizes brancos foram indicados para os dois prêmios destaque da noite. O que não se deu por carência de oportunidades: no mesmo período foram exibidos os longa-metragens Creed: Nascido para Lutar, Straight Outta Compton: A História do N.W.A., Beasts of no Nation e The Hateful 8, todos protagonizados por atores negros. Idris Elba, Samuel L. Jackson e Michael B. Jordan foram injustamente ignorados apesar das muito bem avaliadas performances. Mesmo tendo alcançado um extenso público, o movimento não foi suficiente para expor ou extinguir todo o preconceito baseado em cor de pele por parte dos membros da Academia, já que ele está enraizado em sua estrutura e se propagou por todas as anteriores e posteriores votações. Assim se dá, não ironicamente, o questionamento: quantos anos serão necessários para que haja igualdade dentro das premiações? Será que apenas o tempo tornará o Oscar, de fato, não tão branco?
Dentro da esfera do preconceito, ambos os grupos citados sofrem, por motivos e de maneiras distintas, com a exclusão nas premiações, que não para dentro dos limites do tapete vermelho e se estende a outros palcos. O movimento para alcançar a necessária representatividade diversa nas indicações e prêmios é apenas a superfície da luta para superar séculos de racismo e machismo existentes em nossa sociedade, o que não vai ocorrer com rapidez. Aos poucos, o mundo contemporâneo tem abraçado as comunidades oprimidas, como as formadas por negros, mulheres e LGBTQ+, e tal vivência trazendo esperança para as futuras gerações. O caminho a ser percorrido é longo, e exigirá uma marcante mudança na estrutura do sistema responsável por escolher quem merece ou não segurar a estatueta nas mãos ao final da noite.
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