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Proerd é mesmo a solução?

  • Cecília Pessoa
  • 3 de fev. de 2022
  • 3 min de leitura

No Brasil atual, a maioria dos presos responde por crimes relacionados às drogas. Frente a um país onde as manchetes abordam este tema diariamente, a polícia militar se encarrega de programas de prevenção ao uso de drogas. O principal deles é o Proerd (Programa Educacional de Resistência às Drogas e à Violência), um projeto educacional onde policiais com histórico limpo e que passam por um curso específico vão às escolas e propõe às crianças atividades, reflexões e até mesmo exercícios com o fim de diminuir o consumo de drogas.


A eficiência do Proerd, porém, tem sido questionada nos últimos anos. Um estudo realizado pela Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) e financiado pela Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) aplicou dois questionários em turmas do quinto e do sétimo ano que passaram ou não pelo programa; o primeiro questionário foi aplicado no início do curso e, o segundo, nove meses após a graduação. Os resultados indicaram não haver diferença significativa entre os grupos e, em alguns casos, mostraram uma maior intenção dos alunos que passaram pelo programa a aceitarem eventuais ofertas de álcool, tabaco e até mesmo maconha.


Os possíveis motivos para tal são diversos. Em primeiro lugar, muitas das atividades não fazem sentido levando em conta o nível de escolaridade dos alunos: um exemplo é o de alunos do quinto ano, que, mesmo apresentando dificuldades em ler e escrever, participaram do Proerd através da escrita de redações e leitura de textos. Alguns alunos relataram sentirem falta de um acompanhamento após o curso, como a disponibilidade de profissionais com quem pudessem se abrir sobre o tema. Além disso, o fato de o curso ser aplicado por policiais contribui para um distanciamento dos alunos, dado ao fato de terem menos contato com os mesmos.


A principal razão, porém, está relacionada às origens do projeto. O Proerd foi implantado no Brasil em 1992 partindo diretamente de um programa americano, também aplicado pela polícia, conhecido como D.A.R.E. (Drug Abuse Resistance Education). Um primeiro ponto é o de os materiais utilizados neste não terem sido adaptados para o uso nas escolas brasileiras, apenas traduzidos. Assim, há um descompasso muito grande entre as situações indicadas nos vídeos e textos e a realidade dos alunos. Alguns exemplos apresentados eram o de amigos levando vinho à partidas de futebol ou escondendo drogas em armários individuais, comuns em escolas americanas.


Outro ponto a ser levado em consideração são questionamentos acerca do próprio D.A.R.E.. O programa, nascido na década de 1980, também apresentou ineficácia, gerando apenas uma redução momentânea do consumo de tabaco entre os alunos, mas não de álcool e maconha. Assim sendo, em 2008 o projeto foi reinventado e adotou um novo currículo chamado “Keepin’ it REAL” que foca mais na tomada de decisão dos adolescentes do que nas drogas em si. Diferentemente do D.A.R.E., o Keepin’ it REAL vem apresentando resultados positivos, embora o consumo de drogas entre jovens americanos ainda seja alto. No Brasil, o currículo foi aplicado em 2014 sob o nome de “Caindo na REAL”, mas, mesmo assim, os problemas persistiram.


Um exemplo de país extremamente bem-sucedido no que tange à redução do consumo de drogas entre jovens é a Islândia. Em menos de duas décadas, a Islândia passou de país europeu onde jovens mais consumiam álcool à local onde chega a ser raro encontrar usuários de drogas nesta faixa etária. De acordo com os desenvolvedores do programa que levou à tal façanha, os pontos-chave foram o uso de evidências científicas e pesquisas, a aplicação de práticas locais que levavam em consideração o contexto de cada cidade e o diálogo entre pesquisadores e os responsáveis pelas políticas públicas.


O grande segredo, portanto, foi a realização de pesquisas comportamentais frequentes na população. A cada dois anos são aplicados questionários nas escolas acerca do consumo de drogas e, com base nos resultados, são tomadas medidas práticas para melhorar a situação. Por exemplo, o investimento em esportes aumentou, visto que os estudos mostraram que aqueles jovens que participavam de atividades extracurriculares tendiam a fazer menos uso de drogas.


O exemplo da Islândia é a maior prova da importância da pesquisa para a criação de um programa efetivo na luta contra as drogas na adolescência. O grande defeito do Proerd é o fato de não ter como base principal a realidade específica do cenário psicológico brasileiro. Se quisermos realmente diminuir o consumo de drogas em nosso país, será necessário que nós compreendamos enquanto nação e termos a capacidade de entender as singularidades na vida de cada criança que acabam levando ao consumo de drogas tão precocemente.

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