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"Rechazo”: Proposta para a Constituição Chilena é Negada

  • Foto do escritor: Antonio Moscatelli
    Antonio Moscatelli
  • 16 de set. de 2022
  • 4 min de leitura

No último domingo (04/08), os chilenos decidiram através do voto se aprovariam a proposta para a nova constituição do país, uma consequência direta dos protestos de 2019. Com aproximadamente 60% dos votos, “Rechazo” saiu vitorioso sobre o “Apruebo”, então o que vem agora? Ou ainda, como chegamos aqui? Protestos? Constituição?


Em 2019, o Chile passou pelos seus maiores protestos da era recente, conhecidos como o “Estallido Social”, as pessoas foram as ruas primeiramente na capital, Santiago, para protestar por um aumento nas taxas de transporte público pulando catracas do metrô em 7 de Outubro. Em 18 de Outubro, os protestos escalaram a ponto do então presidente, Sebastián Piñera, declarar um estado de emergência por 15 dias. O que antes fora por transporte, cresceu e se tornou majoritariamente por mudança e igualdade. Em 21 de Outubro, o presidente realiza um pronunciamento público em que pedia perdão por não ter reconhecido os problemas que afetavam a sociedade chilena, propondo mudanças pequenas e moderadas no projeto da “Nova Agenda Social”. Apesar disso, os protesto continuaram, culminando na “Marcha más grande de Chile”, que de fato foi o maior protesto Chileno, com a presença de 1,2 milhão de pessoas. Como consequência, Piñera convocou um referendo para decidir sobre uma das maiores demandas do protesto: uma nova constituição - que só ocorreu em 25 de Outubro de 2020, devido à pandemia.


Como resultado, aproximadamente 80% dos votantes quiseram uma nova constituição, cujos membros 155 foram eleitos em em maio de 2021 de forma paritária - com 50% de homens e 50% de mulheres e cadeiras reservadas para representantes de etnias indígenas reconhecidas pelo Estado. Mas, por que uma Constituição nova?


Para esclarecer, o Chile foi governado por uma ditadura militar de 1973 a 1990, sob o comando de Augusto Pinochet. Durante esse período, Pinochet realizou um referendo para uma constituição nova em 1980, uma votação que - sob intensas suspeitas - acabou por aprovar a criação da carta magna que viria a reger o país até a atualidade. Por ter sido criada justamente nessa época, ela apresenta dificuldades para o movimento progressista atual. Para Claudia Heiss, chefe do departamento de Ciência Política da Universidade do Chile e autora do livro “Por que precisamos de uma nova constituição?”, em uma entrevista de 2020 para VICE: “A atual Constituição é uma trava para manter as coisas como elas eram no fim da ditadura, e assim foi desenhada com esse propósito: ela tem prevenido a mudança de ocorrer.”


E foi assim que, no dia 4 de Julho deste ano, a Convenção Constitucional entregou sua proposta, que, após 2 meses, foi votada. Num breve resumo das maiores mudanças em seus 388 artigos, temos:


Paridade Política e Igualdade de Gênero e Aborto: o regime democrático passa a ser definido como inclusivo e paritário (art. 1.2), de modo que 50% dos membros em todos os órgão colegiados do Estado e diretórios de empresas públicas (art. 6.2) sejam mulheres. Além disso, estão previstos o direito a uma remuneração equitativa pelo mesmo trabalho (art. 46.2) e a obrigação do Estado de criar políticas de conciliação entre a vida profissional e familiar (art. 46.4, 49.2 e 50.1). Além do direito ao aborto (art. 61.2).


A Natureza como Sujeito de Direitos: A natureza passa a ser considerada sujeito de direitos (arts. 18, 103, 119.8 e 127, entre outros): “A natureza tem o direito de ter respeitadas e protegidas a sua existência, a regeneração, a manutenção e a restauração das suas funções e equilíbrios dinâmicos, que compreendem os ciclos naturais, os ecossistemas e a biodiversidade.” Para a Comissão de Professores de Direito Constitucional da Universidade do Chile, os direitos assim deixam de estar ligados exclusivamente à noção de dignidade humana, gerando uma mudança de paradigma com efeitos difíceis de se prever:


“Não é possível ignorar que o exercício dos direitos das pessoas, assim como a atividade humana em geral, podem entrar em conflito com alguma forma de preservação da natureza. Sendo a natureza sujeito de direitos, tal conflito constituirá uma colisão de direitos fundamentais, o que implicará, em princípio, ponderar direitos de hierarquia semelhante e não, como acontece hoje, um direito humano e um bem jurídico de especial proteção.”


Reconhecimento dos Povos Indígenas, Titularidade da Soberania e um Estado Plurinacional: Finalmente, Chile passa a reconhecer expressamente os povos indígenas em sua constituição, com seu direito à identidade, preservação e revitalização e transmissão de saberes e patrimônio cultural (arts. 5.1, 65.1, 12, 36.5 96, 100 e 102). Além disso, essa proposta constitucional tornaria o Chile um país “plurinacional”: a soberania do Estado deixa de residir na “nação” e passa a residir no “povo” (art. 2), tornando o Estado composto por diversas nações, algumas reconhecidas individualmente e expressamente como pré existentes (art 5.2). Para os professores, essa afirmação gera o risco de uma soberania fragmentada entre o Estado chileno e as nações indígenas, pois, além disso, também lhes é garantido o exercício da autodeterminação (art. 5.3) e autogoverno (art. 34) - com pluralismo jurídio que coexista com o sistema nacional (art. 309 e 322).


Entretanto, essa proposta foi rejeitada. Então, e agora? Após essa derrota, o atual Presidente Gabriel Boric, disse em pronunciamento que respeita a decisão do povo chileno e a toma como indicativo para que uma nova proposta seja feita com mais diálogo, respeito e carinho, esperando fazer o possível para colaborar com o congresso e entregar o cronograma de uma nova constituinte que ouça a ampla maioria do Chile. Admitindo também a presença de desigualdades e injustiças que “não podem ser negadas ou escondidas”, assim, o tom do pronunciamento permaneceu de unidade frente às diferenças. Espera-se então que seja escrita uma nova proposta, dessa vez menos progressista e feita com maiores acordos e menores mudanças.




REFERÊNCIAS:


Mello, M de. Chile vota neste domingo SE aprova ou rejeita Nova Constituição; relembre O processo [Internet]. Brasil de Fato. 2022 [cited 2022Sep11]. Available from: https://www.brasildefato.com.br/2022/09/04/chile-vota-neste-domingo-se-aprova-ou-rejeita-nova-constituicao-relembre-o-processo


Chile Rejeita Nova constituição em plebiscito [Internet]. G1. 2022 [cited 2022Sep12]. Available from: https://g1.globo.com/mundo/noticia/2022/09/04/chile-rejeita-nova-constituicao-em-plebiscito-diz-imprensa-local.ghtml


VICE NEWS. How Chile finally scrapped its dictator-era constitution [Internet]. Youtube. 2020 [cited 2022Sep12]. Available from: https://www.youtube.com/watch?v=EF6RJESEBEU


Ovalle Valdés A, Cea Egaña JL, Concha Zavala G, Fermandois Vöhringer A, Romero Guzmán JJ, Rosales Rigol C, Soto Velasco S. EDITORIAL: Análisis de la propuesta de nueva Constitución a la luz de principios del constitucionalismo. Rchd [Internet]. 31 de agosto de 2022 [citado 11 de septiembre de 2022];49(2):V-XXXIII. Disponible en: http://revistanortegrande.uc.cl/index.php/Rchd/article/view/53315


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